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há um mês

Relatório sobre a Educação no Brasil [parte 3]

Rio de Janeiro — Seja o farol que ilumina o “Porto da Esperança”

Seikyo Shimbun

07/08/2025

Relatório sobre a Educação no Brasil [parte 3]

Aspecto descontraído da família Soka do Rio de Janeiro. Foto: Seikyo Shimbun

A luminosidade do Rio de Janeiro talvez seja a mais intensa de todo o Brasil. Na praia de Copacabana, é possível aproveitar o mar o ano inteiro. O brilho refletido nas areias brancas faz com que o céu e o oceano pareçam ainda mais resplandecentes. O Carnaval, tradição anual, transforma-se num desfile de samba iluminado que atravessa a madrugada.

Este relatório educacional volta o olhar para os bastidores dessa cidade cheia de luz. A equipe do Seikyo Shimbun entrevistou educadores Soka, que em comunidades carentes marcadas pela violência cotidiana, trabalham e acreditam profundamente nas crianças e constroem laços de coração com elas.

Decisão de construir uma escola baseada no humanismo

As paredes externas e as janelas da escola de ensino fundamental estão cheias de buracos. São marcas de tiros — vestígios dos confrontos entre as facções criminosas e a polícia.

Os tiroteios ocorrem sem hora e lugar. “Às vezes, começam de repente, até durante as aulas”, conta Tatiane da Conceição Carneiro, vice-responsável pela Divisão Feminina (DF) do distrito local e coordenadora pedagógica da escola.

Ela declara com firmeza: “Minha missão é criar conexão entre cerca de oitocentos alunos e alunas, suas famílias e cerca de setenta educadores e funcionários. É apoiar todos eles. É proteger vidas”.

Tatiane decidiu seguir o caminho da educação aos 27 anos. O impulso veio ao ler o longo poema do presidente Ikeda intitulado Brasil, Seja Monarca do Mundo!, ao se deparar com os versos:

Que sejam humanistas de braços fortes
em luta solidária
com as pessoas deserdadas.

A imagem das crianças do Rio surgiu em sua mente como vidas que ela precisava proteger.

Tatiane cursou pedagogia na Universidade Federal e começou a lecionar aos 33 anos. Quem sempre a apoiou com dedicação inabalável foi sua mãe, praticante fervorosa da fé.

Ela é carioca de nascimento e de coração, a mãe se encheu de alegria quando, em 2002, o presidente Ikeda foi homenageado como cidadão honorário da cidade do Rio de Janeiro. Talvez tenha sido porque sensei enalteceu a organização Soka do Rio como a “Kansai do Brasil”.

Seu bordão favorito era em dialeto japonês: Maketara akan!“Jamais seja derrotado!”.

Essa mãe tão querida faleceu em 2021, vítima de uma doença. Coincidentemente, foi no mesmo ano em que Tatiane assumiu o cargo atual na escola. O compromisso de Maketara akan! foi herdada da mãe pela filha, como um juramento de vida.

As comunidades carentes são lugares onde se formos listar tudo o que falta às crianças parece não ter fim. Faltam confiança e amor por parte dos adultos. Falta um espaço onde se sintam seguras e acolhidas. Falta a sabedoria e os meios para resolver conflitos com os amigos de maneira não violenta. E, acima de tudo, falta esperança.

“Vamos transformar esta escola numa ‘escola humanística’, onde tudo isso possa ser conquistado.” Foi esse o apelo que Tatiane fez aos alunos, pais, responsáveis e profissionais da educação. Logo depois, iniciou a recitação de três horas de daimoku diário, com a oração sincera: “Por favor, que eu possa me tornar uma educadora digna da confiança de todos”.

Tatiane recebe cada criança na entrada da escola com um abraço caloroso. Mantém diálogos constantes e individuais com os responsáveis e com os demais educadores. Quando os alunos entram em confronto físico, ela intervém para separá-los. Mesmo sendo alvo de gritos, tais como “Quem essa professora pensa que é?” ou “Na comunidade, quem manda é o crime!”, vindos até de pais e mães, ela manteve firme sua postura: “Diálogo. Ainda assim, o diálogo!”. Essa atitude, em si, é a verdadeira expressão da “educação humanística”.

E qual é a base do diálogo? É a palavra, o meio essencial para se comunicar e criar a compreensão. Por isso, junto com a equipe pedagógica, ela decidiu fortalecer o ensino da alfabetização, envolvendo a escola nesse esforço.

“Professora Tatiane, por que a senhora é tão forte e tão gentil?” Sempre que os alunos lhe fazem essa pergunta, ela responde sorrindo:
“É porque eu tenho um mestre chamado presidente Ikeda”. Inspirado por sua postura, um dos educadores da equipe disse:
“Quero ser como você”, e também começou a praticar a fé.

Em diversas ocasiões, Tatiane lê para as crianças a frase “A esperança é o maior tesouro da vida” do poema do presidente Ikeda, intitulado Esperança, Tesouro da Vida. Ao ouvirem essas palavras de encorajamento, os alunos e as alunas se sentem profundamente tocados e passam a se empenhar ainda mais nos estudos. Ao verem essa mudança, os próprios pais se surpreendem — e passam a nutrir esperança. O diálogo dentro das famílias também aumenta.

Tatiane da Conceição Carneiro, coordenadora pedagógica

Tatiane da Conceição Carneiro, coordenadora pedagógica. Foto: Seikyo Shimbun

Em reconhecimento a essa prática transformadora, Tatiane foi homenageada pela Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro há dois anos. “A comunidade mudou a partir da escola.” Essa é a percepção real dos próprios moradores.

A resposta está no Sistema Pedagógico de Criação de Valor

Vinicius Pimentel conversa com uma criança

Vinicius Pimentel conversa com uma criança. Foto: Seikyo Shimbun

Vinícius Pimentel, líder de distrito e professor de uma escola de ensino fundamental também situada numa comunidade carente, perdeu o pai aos 13 anos, vítima de um episódio de violência ocorrido no Rio de Janeiro. Leia relato do Vinícius no jornal Brasil Seikyo. Clique aqui.

A dor foi indescritível; a miséria financeira, esmagadora. Mesmo assim, ele não se deixou consumir pelo ódio nem pela desesperança. “Foi graças ao incentivo da minha família Soka e do presidente Ikeda”, afirma ele. Inspirado pelas atividades da Coordenadoria Educacional e pela obra do primeiro presidente da Soka Gakkai, Tsunesaburo Makiguchi, Soka Kyoikugaku Taikei [Sistema Pedagógico de Criação de Valor], ele tomou uma firme decisão: “Quero ser um farol de esperança que ilumina o caminho das crianças”.

O presidente Makiguchi aplicou o conceito budista “abrir, revelar, despertar e conduzir” (kai-ji-go-nyu), ensinado no capítulo 2, “Meios Apropriados”, do Sutra do Lótus, como princípio fundamental da educação. Todo ser humano possui um poder ilimitado de criar valor. A missão da educação é abrir esse potencial, mostrá-lo, levá-lo à compreensão e ajudar a incorporá-lo. Entre esses quatro passos, o mais importante é “abrir”. Ou seja, despertar nos alunos a vontade interior de aprender — abrir o coração deles para o desejo de crescer e de estudar.

Vinícius valoriza muito o que chama de “três diálogos”.

O primeiro é o “diálogo para compreender a criança”. Trata-se de conversar para saber como a criança vive e quais são seus interesses. Um diálogo para “ouvir bem” e “conhecer bem”. É um momento em que a criança sente que o professor realmente se importa com ela. Só com essa confiança, a criança consegue se abrir para o educador.

O segundo é o “diálogo para incentivar os educadores”. No Brasil, os professores enfrentam condições difíceis e a sociedade muitas vezes não os valoriza. Quando um professor perde a confiança, Vinícius compartilha suas experiências, dizendo: “Eu também passei por isso.” Juntos, refletem sobre como superar os desafios, e ele sempre oferece palavras de incentivo como “Professor(a) Fulano(a), você vai conseguir!”. Fortalecer os educadores é essencial, pois é por intermédio deles que se abre o caminho para o futuro.

Por fim, o terceiro é o “diálogo para compartilhar esperanças”. Durante as aulas, Vinícius conta histórias de pessoas que realizaram seus sonhos. São relatos da própria vida e do percurso dos companheiros que conheceu na Soka Gakkai. Além disso, é a oportunidade para falar profundamente sobre as esperanças dos alunos: “Que tipo de adulto você realmente quer ser?”; “Que futuro pode se abrir se você estudar?”. Esse diálogo é um momento para nutrir e fortalecer os sonhos e a motivação dos estudantes.

A escola de Vinícius, alguns anos atrás, ocupava a última colocação na avaliação educacional de âmbito nacional. De repente, subiu para o segundo lugar na cidade. Os responsáveis pela educação municipal ficaram surpresos e perguntaram: “Como vocês conseguiram isso?”. Vinícius entregou-lhes o livro Soka Kyoikugaku Taikei [Sistema Pedagógico de Criação de Valor] e disse: “Aqui está a resposta”.

“O que mais me enche de alegria são as conquistas dos ex-alunos.
Costumo encontrá-los, ao saírem para o trabalho, caminhando com orgulho e confiança. ‘Estou me dedicando muito na universidade!”; “Quero ser professor, igual ao professor Vini!’.”

Esses jovens representam, sem dúvida, a esperança do Rio de Janeiro.

Série especial do Seikyo Shimbun sobre a educação no Brasil

Em 06 de junho de 2025, aniversário natalício de 154 anos de Tsunesaburo Makiguchi, Seikyo Shimbun lança série especial sobre as práticas da educação Soka no Brasil. 

Clique aqui e leia a parte 1 que narra a história da Escola Estadual Eça de Queiroz, em Diadema.

Clique aqui e leia a parte 2 que narra a história da cidade de São José dos Campos — Uma cidade onde os ideais dos Três Mestres Soka estão enraizados nas escolas

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